2005-05-13

vil hipocrisia - 2

1 É de profundo mau gosto - para dizer o mínimo - tecer considerações sobre o aborto no funeral de alguém.

2 A falecida era uma criança de cinco anos que foi morta por agressões físicas violentíssimas infligidas, alegadamente, pelo pai e a avó (!), e cujo corpo fora deitado ao Douro; ou seja, vítima de violência extrema. Conseguiremos imaginar tal barbárie? Tal como referi num texto anterior, o mal reside dentro de nós.

3 Justificar depois, não retirando o que disse, que uma criança no ventre da mãe "não se pode defender" de qualquer agressão, enquanto "uma criança de cinco anos pode reagir, pode chorar, queixar-se"?! De certo que a Vanessa lutou até onde pôde, mas foi cobardemente assassinada, uma vida foi tirada. E quando o dito padre afirma que "há mortes que são mais graves e outras que são menos graves" nunca, mas nunca pode colocar a questão neste termos. Menos grave é a morte do criminoso e não da vítima, mas isso coloca-nos no plano da justiça olho-por-olho-dente-por-dente que (a maioria das) sociedades democráticas tentam evitar, por maior vontade que haja de vingança extrema.

4 Tais afirmações por parte de prelados, cujas reponsabilidades perante a comunidade que servem, reforçam o distanciamento que muitos têm do catolicismo, da religião. A mensagem de Jesus Cristo não é isto. Mas a Igreja é constituída por homens, e estes são fracos e pecam, contudo, os representantes de tal instituição deverão abster-se de comentários violentos e inflamados, incoerentes e extremistas. A questão do aborto - que defendo. tal como na lei apresentada pelo PS - é deveras divisor de opiniões, mas acredito que a maioria da população aceita-o nos termos em que é proposto. Com referendo ou não, a inflamação violenta das afirmações - dos dois lados da barrricada - apenas prejudica aquelas mulheres que à IVG fatalmente recorrem pelas mais diversas razões.

5 A defesa da vida e da dignidade humanas são valores também democráticos, e vivendo numa sociedade civilizada e moderna, onde existe a Carta dos Direitos da Criança, o dito padre menoriza um crime vil por uma ideia/dogma que, lançada ao ar apenas pretende fomentar a ignorância e os preconceitos, o regresso ao passado onde o temor a Deus impera mais que a compreensão da mensagem de paz e amor que, por teorias da conspiração ("Código Da Vinci") ou não, vemos que não vinga na verdade.

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