2005-05-30

Et maintenant?



Por princípio, sou a favor do Tratado Constitucional. Mas como ainda não tive oportunidade de ler com atenção o texto que, polemicamente ontem foi rejeitado em referendo pela população francesa, posso afirmar que nada poderá ficar na mesma. Como todos sabemos, a França é um dos principais motores da construção europeia, mas lá por causa disso não vamos modificar a coisa ao jeito deles. O que é necessário então? Continuar com os seguintes referendos - na quarta-feira a Holanda referenderá talvez do mesmo modo - continuando com o processo legal de ratificação? Mas com dois "nãos" a Constituição nunca entrará em vigor. Discutir de novo, redigir novo texto, buscar novos consensos - que a Convenção em ano e meio de trabalho, arduamente atingiu - ficarmos a funcionar sobre a confusão do Tratado de Nice? A nova construção da União Europeia visa um espaço mais político, logo mais forte e mais coeso, e um texto constitucional único assim o planifica e põe em prática. Assim como para a edificação de um espaço social e solidário, promotor do desenvolvimento, coexistência e felicidade enquanto povos europeus unidos. O "não" francês adia este projecto inédito. Que para alguns poderá representar um retrocesso, para outros um ganho. À partida creio que seja um passo atrás, um pesado passo atrás. Como já referi várias vezes, o
projecto Europa é também o meu sonho, a minha esperança.

2 comments:

  1. "Está aberto o caminho a repensar-se a União de forma diferente da dos últimos anos, mais democrática, mais solidária, menos ambiciosa e mais prudente. Melhor para todos os europeus, melhor para a Europa."
    Pacheco Pereira, Abrupto

    "A crise europeia que o falhanço da Constituição anuncia só pode ser celebrada em Londres, Washington, Pequim ou Nova Deli, e por todos os que não desejam uma Europa mais forte na cena económica e política mundial. O falhanço francês é também o falhanço da UE."
    Vital Moreira, Causa Nossa

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  2. Editorial "A Capital":

    Orgulhosamente sós e patéticos

    A maioria dos franceses, com uma taxa de abstenção muito reduzida, escolheu rejeitar a Constituição europeia e, desse modo, lançou uma enorme indefinição sobre o futuro comum do velho continente.
    O forte descontentamento social, a desconfiança em relação aos políticos, uma detestável e crescente xenofobia, a arrogância nacionalista dos sectores mais extremistas do quadro partidário (à direita e à esquerda), a pouca vontade de pagar as contas dos novos países aderentes e o medo da perda de soberania, o medo da perda de regalias dos corporativos sectores agrícolas e industriais, o medo do liberalismo, o medo da América e do seu aliado Durão Barroso, o medo das deslocalizações e o medo da própria sombra, foram alguns dos motivos que levaram a maioria dos franceses a escolher dizer «não».
    A França matou o sonho europeu ou, pelo menos, adiou--o por largos anos. E, apesar de aparentemente ter este poder, é um país que não tem sabido ler os sinais da sua decadência. Hoje por hoje, como os resultados do referendo puderam confirmar, a identidade francesa impõe-se por aquilo que rejeita, não por aquilo que quer ou deseja.
    Da pátria da grande revolução que decretou «Liberdade, Igualdade e Fraternidade» resta um país extremista, racista, temerário, pouco solidário, um país em que os principais políticos estão muito mais preocupados em sobreviver do que em deixar uma marca. Um país incapaz de fazer compromissos por ter de si próprio uma ideia que já nada tem que ver com a verdadeira realidade. Essa foi a França que rejeitou a Constituição europeia, foi essa a França que matou o sonho europeu e o outro país que nos habituámos a ler nos livros de história, uma nação universalista e amante do progresso.
    Ontem, milhares de franceses aplaudiram em delírio a vitória do «não». Houve palavras de ordem contra o poder dos Estados Unidos, mas os pobres que gritavam na rua não pensaram por um momento que um dos maiores vencedores da noite de domingo foi, precisamente, a administração norte--americana. Ter como adversário político-económico uma Europa dividida é melhor do que o contrário, argumento talvez demasiado elaborado para que pudesse ser percebido.
    O que fazer agora? Apesar de o tratado prever a sua rejeição por vários Estados-membros, a solução apresentada, depois de três anos de trabalho e compromissos entre os vários países, torna-se pouco menos do que inviável. O tratado de Nice continuará a ser o que conta, um tratado tão liberal como a proposta da constituição que foi rejeitada, mas com a desvantagem de não conter a defesa de uma política social adaptada ao mercado. Com a desvantagem também de a UE ficar em gestão corrente, de ficar vedada por tempo indeterminado a entrada da Turquia e da Croácia, de não conseguirmos estar à altura da grande investida asiática e da liberalização dos mercados económicos. Além do mais, que moral terá a Europa para pedir à França o cumprimento do pacto de estabilidade e crescimento?
    É um dia negro para a Europa, mais um. Talvez o fim de um sonho.

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