2005-01-21

Política: do pior

"Falta ainda um penoso mês. Um mês desta patética campanha, em que o primeiro-ministro acha que passar os dias em inaugurações e nomeações de última hora é sinal de que está a trabalhar, e o líder da oposição acha que a alternativa é falar muito sem dizer nada. José Sócrates tem um mês - não para derrotar Santana Lopes, que se derrota a si próprio cada dia que passa, mas para convencer os eleitores de que vale mais votar no PS do que votar em branco. Entre o nada e o vazio sempre existe uma diferença."

"Pior é possível" , Miguel Sousa Tavares

2 comments:

  1. A Capital
    Editorial de hoje
    Luis Osório

    Perdoai-lhes porque não sabem o que fazem

    George W. Bush iniciou ontem o último mandato como presidente dos Estados Unidos. Anunciou que o seu grande objectivo será a luta contra a tirania no mundo, batalha que jurou travar em nome da democracia. O discurso, assim como todos os festejos e proporcionais protestos, foi seguido por milhares de polícias e soldados. Atiradores por cima de telhados, homens e mulheres à paisana atentos ao mínimo movimento e 31 milhões de euros gastos para que a pompa não pusesse em causa a circunstância de Bush ser uma ameaça séria para o que resta do instável equilíbrio do mundo.
    No próximo mandato irá contribuir para que o mundo seja mais inseguro, irrespirável, corrupto e intolerante. Em nome de Deus, e da propalada superioridade moral americana, tentará deixar uma marca inesquecível na história, algo de suficientemente importante para que as gerações futuras o recordem como alguém que não passou por entre os pingos de chuva. É o habitual neste tipo de figuras. Desprezados pelas elites, a quem tentam menorizar, utilizam o poder do dinheiro e das armas como instrumento essencial e remetem a diplomacia para as calendas mais acessórias.
    Bush, que ontem pediu união ao seu povo, terá a tentação de tentar resolver a questão do Iraque com ameaças directas ao Irão; fará uns raides às fronteiras da Coreia do Norte e chamará consultores, economistas, espiões e outros profissionais da Casa Branca para o aconselharem na delicada questão do poder crescente da China. Entre batalhas, algumas delas tácitas, que preenchem a quase totalidade do seu mapa-mundo privado, moverá o que lhe for possível mover para provar que foi o presidente decisivo na resolução do conflito entre Israel e a Palestina.
    O que mais inquieta é ver transformado o mundo num lugar onde deixámos de poder caminhar em paz, onde a morte nos pode apanhar a nós e aos nossos filhos na próxima esquina, um mundo que parece estar a desagregar-se como se fosse um baralho de cartas, e nós, figuras utilizadas para fazer bluff e não gente de carne, osso e sentimentos.
    Este presidente americano, ao dar início ontem ao segundo mandato, é o garante de que a tirania continuará a ter um pasto certo onde se alimentar. Continuarão a semear o horror no mundo e a ameaçar-nos com a sua intolerância porque têm um álibi mesmo à mão. Bush precisa dos terroristas para não rebentar de vazio, os terroristas precisam de Bush para espalhar com eficácia as suas mensagens de ódio.
    Nos próximos quatro anos não teremos razões para sorrir, muito pelo contrário. Teremos, isso sim, razões para desconfiar do dobrar de todas as esquinas do mundo, razões para continuar a ter medo e contaminarmos os nossos mais queridos com esse pânico que nos vai alterando a composição do sangue. Milhões de americanos elegeram Bush, e por isso celebraram nas avenidas a sua vitória contra tudo e contra todos. Perdoai-lhes porque não sabem o que fazem.

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  2. "Voto fútil"
    Jacinto Lucas Pires
    A Capital

    O cartaz do PP, numa estranha escolha de composição, mostra o rosto recortado de Paulo Portas entre letras garrafais que escrevem «voto», de um lado, e «útil», do outro. A piada que corre é que a cara do demissionário ministro da Defesa e dos Assuntos do Mar está ali, assim tão sem escala nem contexto, para tapar um «f». Por baixo, diz-se, o que está escrito é «voto fútil». Seria essa a razão para tão estrambólica composição gráfica, em que dá ideia que as palavras entram no líder por um ouvido e saem por outro. Trata-se, naturalmente, só de uma graça, mas uma graça com sentido e que lhes fica mesmo bem. Se há partido confiante no truque mediático para tapar buracos e incoerências populistas, esse partido chama-se PP.

    Agora os seus dirigentes e candidatos parecem apostados em fazer render o papel de parceiro estável da ex-pré-coligação com o PSD, verdadeiro “braço direito” para Portugal. Tal atitude, para além de demonstrar o estado de pré-falência a que chegou o partido social-democrata, só nos pode fazer rir. Basta ter um pouco de memória para estarmos conversados sobre a «estabilidade» destas figuras e deste «projecto político». Os que tomaram o CDS e o refundaram em PP, segundo uma nova cartilha populista e anti-Europa, são os mesmos que hoje, com a maior cara-de-pau, deixam cair expressões como «valores da democracia-cristã» ou «marca CDS». Aí, por exemplo, traem-se. A verdade é que é assim que entendem a política: como mero jogo de aparências, concurso de frases-anúncio, televenda de «marcas».
    Mas as pessoas têm memória. O tal «f» não faz falta nenhuma.

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