V: Incompetência de uns para pagarmos todos.
I: Podes crer. É tão fácil governar este país. Pode-se fazer tudo, se faltar dinheiro, aumenta-se os impostos e volta-se a aumentar os impostos. Não há maneira de criminalizar esta gente. Responsabilidade política não chega.
V: À responsabilidade política não é imputável responsabilidade judicial.
I: Pois o problema é esse.
V: A desresponsabilização dos actos leva a qualquer tipo de governação. Incompetência equivale a muita coisa - mas politicamente corresponde também a falta de seriedade.
I: Todos lesam o Estado em milhões que provocam pobreza e dificuldades. E a consequência? Talvez não seja reeleito. O problema reside na base: este sistema ou dá uma volta de 180 graus ou daqui a 4 ou 5 anos estamos pior e com medidas piores.
V: E toda a gente sabe disso há 10 anos. É certo que gerir um Estado não é como gerir uma empresa - a brutalidade de escala assim nos engole - mas os princípios de gestão são os mesmos, e sendo o dinheiro de todos, mais rigor se obriga a ter, com bom senso e sentido de Estado.
I: É verdade, a complexidade e dimensão do Estado relativiza análises simplistas. Mas pode-se fazer uma comparação básica: se na nossa casa começarmos a recorrer ao crédito para ir ao supermercado e para comprar roupa, ou mudamos de vida ou acabamos na miséria. O Estado neste momento está assim, já necessita de financiamento para pagar os ordenados da função pública. Isto não pode acabar bem, só quem é muito burro não consegue ver isto.
V: Como milhares de famílias estão hoje aflitas, desde os EUA até cá. Actos inconscientes provocaram ilusões inconsequentes.
I: É mesmo. Vivemos no mundo das ilusões e são os Estados a fomentar essa ilusão, E não são estas medidas que vão resolver nada. É muito mais profundo do que aumentar o IVA até aos 50%.
V: Existe muito mais despesa do Estado para cortar, como em tantos institutos que existem. É frase feita que "o poder corrompe", eu acrescento que "o poder alucina". Para o Governo tudo sempre esteve e estará bem.
Lembras-te do "óasis" do ministro de Cavaco, Braga de Macedo?
I: Se lembro. E a culpa ao contrário do que querem fazer crer não é só deste governo. Vem de há 15 ou 20 anos a esta parte. Os princípios são os mesmos. Somos de facto um país mais moderno que há 20 anos, mas com o dinheiro dos outros.
V: Que não consegue reproduzir a sua própria riqueza em quantidade suficiente.
I: Andamos a comprar roupa de marca a crédito para estarmos na moda.
V: Eu não.
I: Andamos - este país.
V: Nunca tive cartão de crédito, e roupas de marca compro nos saldos. É esta sensação de incompreensão de "eu n contribui para isto, mas tenho de pagar!?"
I: Sentes tu e toda a gente séria que trabalha com afinco e paga os seus impostos. Quase tudo o que está feito é na base da aparência. O modo de vida dos portugueses vai ser pago mais à frente e não temos capacidade para o fazer.
V: Não se entende. É quase sangue, suor e lágrimas e cada ano que passa é pior que o anterior.
I: É verdade. Estão sempre a pedir sacrifícios e paciência e já ninguém consegue perceber com que objectivo.
V: Uma vez li que como forma de luta seria não pagar os impostos - mas isso seria tão trágico como anarquista.
I: Parece aquelas casas que entram em obras com os moradores lá dentro e que pensam: isto é uma chatice, ficamos com a vida ao contrário, mas quando a obra acabar esta vai ser a casa que sempre sonhámos ter. O problema é esta "obra" não ter fim.
V: Continuo a pensar que uma forma de protesto - para além de sair às ruas, veja-se o caso dos franceses - seria incentivar e tornar real a ficção de José Saramago em Ensaio sobre a Lucidez - o voto maciço em branco.
I: Sim há muitos anos que defendo isso. Aliás sempre o pratiquei. Mas esta gente é tão sem vergonha que acho que nem assim tirariam conclusões. A sério, estou mesmo desiludido com este país. Com as supostas elites que são medíocres e com a generalidade das pessoas que são uns acomodados.
V: Sempre votei em quem acreditava merecer um voto útil. A desilusão com este país é um dos grandes males auto-infligidos. Verdade comunitária, a indignação leva-nos à resignação pelo facto de as alterações não acontecerem. Acabamos por desistir por ser mais fácil, porque difícil o suficiente é resistir na nossa luta diária para nos sustentarmos.
I: Mas observa: em todas as grandes convulsões históricas em quase todas as sociedades havia alguém ou alguns que tinham um objectivo (discutível na sua génese, em grande parte dos casos) mas que lideravam. Nada disso existe nos dias de hoje. A miséria chegou até aí.
V: Se te recordas dos últimos textos que escrevi sobre esta "governação" e "este" país, em A insustentável situação do ser, A estratégia da anestesia e Dias de Abril procuro demonstrar tudo isso.
I: Eu sei, eu li.
V: É um cliché, mas absoluta verdade - estamos mergulhados numa crise de ideias e de valores.
I: Eu diria que estamos fechados num copo virado ao contrário.
V: Essa é uma metáfora extraordinária. Muito bom.
I: Não vejo como voltar a pôr o copo direito. Não vejo mesmo.
V: Apetece fugir, mas não é sempre uma opção viável.
I: Não, não é.
I: Se lembro. E a culpa ao contrário do que querem fazer crer não é só deste governo. Vem de há 15 ou 20 anos a esta parte. Os princípios são os mesmos. Somos de facto um país mais moderno que há 20 anos, mas com o dinheiro dos outros.
V: Que não consegue reproduzir a sua própria riqueza em quantidade suficiente.
I: Andamos a comprar roupa de marca a crédito para estarmos na moda.
V: Eu não.
I: Andamos - este país.
V: Nunca tive cartão de crédito, e roupas de marca compro nos saldos. É esta sensação de incompreensão de "eu n contribui para isto, mas tenho de pagar!?"
I: Sentes tu e toda a gente séria que trabalha com afinco e paga os seus impostos. Quase tudo o que está feito é na base da aparência. O modo de vida dos portugueses vai ser pago mais à frente e não temos capacidade para o fazer.
V: Não se entende. É quase sangue, suor e lágrimas e cada ano que passa é pior que o anterior.
I: É verdade. Estão sempre a pedir sacrifícios e paciência e já ninguém consegue perceber com que objectivo.
V: Uma vez li que como forma de luta seria não pagar os impostos - mas isso seria tão trágico como anarquista.
I: Parece aquelas casas que entram em obras com os moradores lá dentro e que pensam: isto é uma chatice, ficamos com a vida ao contrário, mas quando a obra acabar esta vai ser a casa que sempre sonhámos ter. O problema é esta "obra" não ter fim.
V: Continuo a pensar que uma forma de protesto - para além de sair às ruas, veja-se o caso dos franceses - seria incentivar e tornar real a ficção de José Saramago em Ensaio sobre a Lucidez - o voto maciço em branco.
I: Sim há muitos anos que defendo isso. Aliás sempre o pratiquei. Mas esta gente é tão sem vergonha que acho que nem assim tirariam conclusões. A sério, estou mesmo desiludido com este país. Com as supostas elites que são medíocres e com a generalidade das pessoas que são uns acomodados.
V: Sempre votei em quem acreditava merecer um voto útil. A desilusão com este país é um dos grandes males auto-infligidos. Verdade comunitária, a indignação leva-nos à resignação pelo facto de as alterações não acontecerem. Acabamos por desistir por ser mais fácil, porque difícil o suficiente é resistir na nossa luta diária para nos sustentarmos.
I: Mas observa: em todas as grandes convulsões históricas em quase todas as sociedades havia alguém ou alguns que tinham um objectivo (discutível na sua génese, em grande parte dos casos) mas que lideravam. Nada disso existe nos dias de hoje. A miséria chegou até aí.
V: Se te recordas dos últimos textos que escrevi sobre esta "governação" e "este" país, em A insustentável situação do ser, A estratégia da anestesia e Dias de Abril procuro demonstrar tudo isso.
I: Eu sei, eu li.
V: É um cliché, mas absoluta verdade - estamos mergulhados numa crise de ideias e de valores.
I: Eu diria que estamos fechados num copo virado ao contrário.
V: Essa é uma metáfora extraordinária. Muito bom.
I: Não vejo como voltar a pôr o copo direito. Não vejo mesmo.
V: Apetece fugir, mas não é sempre uma opção viável.
I: Não, não é.
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