2007-09-26

O logotipo da discórdia

Decidi - após a opinião do meu colega - pesquisar opiniões sobre o logotipo dos Jogos Olímpicos de Londres 2012 e coloco aqui o resultado dessa pesquisa e a minha análise.



No dia 4 de Junho foi apresentado o logotipo dos Jogos Olímpicos de 2012, que serão realizados em Londres e que gerou uma grande discussão na internet e entre profissionais e simpatizantes de marketing, artes, comunicação e design. A “polémica criação”, se assim a podemos classificar, envolveu a cifra de 600 mil euros, facto que já serviria para muitas especulações. A aposta numa imagem diferenciada e inovadora – até certo ponto – confirma que, ao fugir do roteiro tradicional de produzir um desenho dentro de padrões estéticos que são “bem aceites”, o impacto conquistado junto ao público e aos meios de comunicação foi instantâneo e enorme, com uma repercussão a altura do glamour do evento. A questão que deve ser analisada, é até onde vale a pena gerar toda esta polémica.

Acima, ao comparar o visual “aceitável” do logotipo de candidatura de Londres como sede para as Olimpíadas (à esquerda) com desenho “diferente” – para alguns estranho – do logotipo oficial (à direita), nota-se que as diferenças das propostas são gritantes. Essa característica, feita de maneira intencionalmente ou não, foi essencial para alcançar o “expressivo resultado” de discussão na opinião pública. Antes de quaisquer julgamentos – sejam a favor, sejam contra – quanto ao logotipo, é necessário verificar qual o objectivo da organização do evento. Se foi gerar notícias, independentemente do posicionamento, o resultado foi positivo. Agora, se em algum momento houve a intenção de conquistar apenas críticas positivas, de facto, essa meta não foi cumprida, uma vez que, se pesquisarmos na internet, encontramos várias – entenda-se muitas – opiniões desfavoráveis.

Foi toda esta miscelânea de opiniões que serviram de mote à criação da minha crítica de design. O que afinal entendemos como bom ou mau design gráfico? Como podemos apontar o dedo a esta criação e antever o seu sucesso ou insucesso? São as respostas a estas e outras questões que tentarei abordar e esclarecer.

Bastaram apenas três dias após o lançamento do novo logotipo para o "The Sun", um dos maiores tablóides de Inglaterra, olhar com descrédito para a criação. Não apenas isso, mas um grande furor motivou 30000 pessoas a assinar uma petição online solicitando a sua substituição e, logo após a emissão do seu spot de lançamento, houve quem relatasse situações de ataques epilépticos após o seu visionamento.

O Medo do Novo
Tudo o que é genuinamente original, normalmente é sempre bastante criticado e pouco aceite até à sua total assimilação. Isto acontece em arte, música e até em design gráfico. Aliás, é esse mesmo facto que os designers mais resistentes alegam: "Dêem uma oportunidade ao logotipo" - disse Lance Wyman que desenhou o logotipo dos Jogos Olímpicos do México em 1968 - "Tem uma forma reconhecível e poderá oferecer várias possibilidades criativas nas aplicações futuras para se manter fresco até 2012. Temos ainda 5 anos pela frente". Desenhado pela agência Wolf Olins, autora de muitos logotipos reconhecidos em Portugal, tal como a EDP e a PT, é talvez o seu trabalho mais polémico.
Se o objectivo principal do logotipo era ganhar reconhecimento e chamar atenção para o evento, então podemos dizer que estamos perante um verdadeiro sucesso. Basta mostrá-lo a alguém nas ruas de Inglaterra para reconhecerem-no imediatamente. Quanto logos poderão gabar-se do mesmo?

O Lado Bom
Apesar da primeira reacção ser de choque, há vários motivos para gostarmos do logotipo.
1. Não é chato: As cores vivas e design distintivo realmente chamam à atenção e é imediatamente reconhecível. Toda a gente fala dele. Os designers estão sempre a reivindicar mais status no meio social, pelo que é de admirar que tão poucos estejam a tomar partido de tão criativa obra.
2. É diferente: Ele evita as normas banais de construção de logotipos. Não tem traços a imitar a mão humana. 3. Não tem sombras. reflexos, gradientes, cores patrióticas, laços, fitas, símbolos de unidade, mapas ou globos.
4. É reproduzível: Apesar da palavra "London" parecer estranha quando representada numa página de internet, é bom ver um logotipo facilmente impresso, emitido e moldável (ao contrário do que aconteceu com o arco-íris de 9 cores impresso nos copos do McDonald's). E até é apelativo em preto e branco.
5. É flexível: Uma variedade de combinações de cores, formas e texturas estão disponíveis, colocando o logotipo ligeiramente diferente em cada peça, mas ao mesmo tempo consistente e uniforme. É preciso ter em mente que este logotipo é para ser usado, quase sempre, em conjunto com outros logotipos menos inspirados dos patrocinadores. Nesse aspecto, este logotipo quadrado certamente sobressairá.
6. É o básico para um sistema gráfico: O evento requer um complicado sistema de sinalética, identificação, decoração e arquitectura. Este logotipo e as suas cores, formas, tipografia e texturas são o perfeito ponto de partida para criar fantásticas soluções de sinalética, ícones, banners, bilhetes, uniformes e merchandising.
7. É intemporal: Sabe-se que todo o design é influenciado por outro design. Mas este design foi feito acima de qualquer influência, apesar de permanecer simples o suficiente para sobressair por ele próprio. Se o estilo for desenvolvido, indo ao encontro das reproduções a 4 cores e apresentações tridimensionais (3D), este logotipo pode permanecer ainda mais actualizado daqui a 5 anos.
8. É um logotipo inglês, sem dúvida: Quando analisamos o design inglês, dois nomes saltam à vista: Neville Brody e Peter Saville, dois designers de reputação comprovada. Apesar de não ter ligação directa com estes, o logotipo dos Jogos Olímpicos de 2012 é uma ovação aos trabalhos destes designers, aos movimentos de nova geração, ao punk, à cultura rave e a tudo o que nos possamos lembrar acerca do Reino Unido.
9. É simples: Quando ouvimos a célebre frase: "Até o meu filho podia ter desenhado aquilo!", pensamos "é um sucesso!". Vendo bem, alguns dos logotipos mais populares são bastante simples, como a estrela da Mercedes. De facto, até uma criança podia ter desenvolvido o logotipo, mas não o fez. Se o seu filho o tivesse feito, parabéns por ter educado um génio. Aconselha-se a enviar o currículo dele à agencia de comunicação mais próxima. Custou 600 mil euros mas pode ser considerada, provavelmente, uma pechincha, já que estamos a falar de um sistema de identidade muitíssimo completo e com uma complexidade de alto-rendimento dirigida a um evento de escala mundial desenhado por profissionais experientes. Qualquer um que avalie a importância do design, deve também saber dar a devida importância ao projecto global.
10. É um logotipo inesperado: Chicago, que está na corrida para os Jogos Olímpicos de 2016, surgiu com um logotipo temporário que é um exemplo decente de design. É atractivo, memorizável e é fácil gostar dele. É ainda um logotipo que absorve algum protagonismo na imprensa e internet. Mas aquelas "pinceladas" e gradientes não se reproduzem bem em todos os suportes. Além do mais, a sua estrutura vertical poderá complicar o seu uso e as torres "Sears", provavelmente, serão o terceiro edifício mais alto de Chicago em 2016. Mais que tudo o logotipo para os Jogos Olímpicos de 2012 transfere a imagem do evento para um novo patamar de abstracção e simplicidade. Talvez estaremos todos a ser um pouco invejosos.

Depois de dezenas de logotipos esquecidos dos anteriores Jogos Olímpicos e campeonatos mundiais de futebol (os logotipos dos campeonatos de 2006 e 2010 estão entre os piores exemplos), é bom ver algo diferente e pensado na sua validade a longo prazo. Certamente não é a criação mais perfeita e as suas mensagens de comunicação talvez sejam algo ridículas, mas assim que o conceito seja interiorizado e aplicado nas diferentes peças da identidade, com certeza tornar-se-á num ícone de orgulho para Londres e para os Jogos Olímpicos.



O Lado Menos Bom

As pessoas repudiam-no: É bom ser tema de conversa, mas não quando a conversa serve só para criticar negativamente. Este é um evento público, pago usando dinheiro público, não seria então lógico o preparar o público para aceitar o logotipo?
O seu design parece influenciado pelas últimas tendências da moda. O problema é que as últimas tendências da moda serão para o ano ultrapassadas e copiadas.
Como tal, o logotipo corre então o risco de ficar "gasto" rapidamente.
As pessoas não irão usá-lo: Estes eventos garantem alguns dos seus ganhos pela venda de material de merchandising, mas este material depende do logotipo que lhes será aplicado. Deve ser algo que as pessoas se orgulhem de mostrar, como o símbolo da Nike. Se o logotipo está a ter um impacto negativo na opinião pública, certamente resultará em más notícias para vendas.
O objectivo do logotipo está também a tentar ser abrangente demais. E isso nota- se pela descrição dada pela Wolf Olins e pelo comité dos Jogos Olímpicos: "Este novo emblema usará o espírito olímpico para inspirar todos e chegar aos mais novos. (...) Esta é uma marca-ícone que resume o que Londres 2012 é - inclusivo, aberto à recepção e diversificado". É esta falta de objectividade que poderá trazer por terra todo o conceito criado.
Este logotipo é um exemplo de design que resulta quando políticos e empresários tentam mostrar-se modernos e actuais, mas que no fim de tudo ficará relegado às classes sub-urbanas que fazem a sua jardinagem com um polo vestido. É uma tentativa frustrada de fazer design "de ponta".
Não é um logotipo bonito, é verdade. Para fazer um trabalho criativo, um designer deve, de início, tomar como base um bom conceito, mas no final do projecto o resultado deve ser sempre apelativo. O logotipo para Munique, não simbolizava a cidade anfitriã, nem nada referia quanto a desporto, mas era elegante e sublime, ao contrário do logotipo de Londres.
As empresas anotarão a enorme propaganda gratuita que este tema assume na imprensa. E irão querer aproveitá-la. Levará isto a uma onda de lançamento de ideias provocatórias e sistemas de identidade rejeitados, de maneira a conseguirem ficar na primeira página dos jornais? Servirá esta identidade, como ponto de viragem contra a actual admiração dos designers para com o modernismo suiço? Será este o momento em que a indústria do design se supera a si própria? Durante anos, empresas como a Wolf Olins, incutiram-nos a história do poder das marcas e que o seu "insight" único devem ser o centro de todas as operações. Será que agora querem dizer que isso tudo não interessa? A juntar a isso, temos o facto (ou teoria da conspiração) que o cliente impediu a Wolf Olins de falar e explicar o seu trabalho à imprensa de forma coesa, esclarecendo o que realmente foi feito e como o sistema de identidade funciona. Esperemos que este episódio sirva de lição a todos os clientes: deixem os designers falarem por si próprios ou a imprensa assume o pior.
Mas talvez, e no fim de tudo, o resultado do logotipo de Londres 2012 irá convencer as autoridades responsáveis pelos Jogos Olímpicos a terminar com um disparate de 40 anos. Já que têm um bom logotipo - os anéis - porque não usá-lo simplesmente como é, apenas alterando o nome da cidade anfitriã para cada evento? Com certeza que poupavam imenso dinheiro ou canalizavam-no para outras áreas onde tal investimento seria realmente útil.

CONCLUSÃO
Foi através de um e-mail que fiquei a conhecer o novo logotipo para os Jogos Olímpicos de 2012. A acompanhá-lo, vinham as opiniões de vários designers e pseudo-entendidos da área. “Horrível” - diziam uns, “Parece um logotipo retirado dos anos 80, aquando o lançamento da MTV!” - diziam outros.
De ínício a minha reacção foi acompanhar a tendência. Estranhei as formas, as cores (o cor de rosa nunca foi das minhas cores favoritas). Fiquei confuso. Queria pensar por mim próprio, mas a minha mente estava ocupada com as opiniões de outras pessoas. Visitei sites e blogs. Tudo estava em alvoroço com o assunto.
Consultei o site da petição online. Os comentários continuavam os mesmos: "Um total desastre", "A coisa mais horrível que vi na vida". Decidi fechar as páginas. Tanta crítica negativa assustou-me. Só passados vários dias, quase por coincidência, retomei ao assunto. Visitei o site oficial do evento. Vi o video promocional do evento (o tal dos ataques epiléticos). Foi a primeira vez que pude contemplar o logotipo e contactar com a imagem gráfica de maneira isolada durante uns bons minutos. Durante este período, sem as palavras "desastre" e "fiasco" na minha cabeça, algo começou a mover-me e passei a gostar do que via. À primeira vista, os números "2012" passaram-me despercebidos. Parecia uma visão do antigo mundo, antes dos continentes se moverem e se posicionarem onde estão hoje, passando depois para uma imagem mais destorcida e indefinida. Pareceu-me uma forma diferente cada vez que olhava para ele.
Comecei a pensar que era capaz de ser um bom logotipo. Poderia não ser tão grandioso como o logotipo do México em 1968, ou o de Moscovo em 1980, mas é bem melhor que o logotipo de Los Angeles em 1984, o de Seul em 1988, o de Barcelona em 1992, o de Atlanta em 1996 ou o de Sidney no ano 2000. Em suma, é o mais interessante logotipo dos Jogos Olímpicos em 30 anos!



O único pormenor que ainda me causa alguma confusão é o tipo de letra da palavra "london". Parece infantil demais. O "l", porque não está em maiúscula? Nada que me preocupe em demasia. Afinal, estamos a 5 anos do evento. E em 5 anos muito se pode corrigir e refinar para melhorar o logotipo.
É nesta altura que comecei a preocupar-me. Ao estar a ir contra a corrente, contra as dezenas (se não centenas) de opiniões de criativos e marketeers pelo mundo fora, estará a meu análise crítica a ficar deturpada? Estará o meu sentido estético a ficar fora de moda e a regredir?

Reflecti e concluí que o problema não estava no logotipo em si. O problema estava, afinal, na definição de logotipo. Durante anos de faculdade e de trabalho profissional, foi-nos incutido um conjunto de regras-base que um logotipo deve, obrigatoriamente, cumprir. Todos nós as conhecemos e, quase instintivamente, as aplicamos - "Memorizável", "Facilmente reconhecível", "De fácil aplicação", "Graficamente simples, mas complexamente desenvolvido", "Com formas apelativas", "Que tenha um significado e explicação fáceis". Contudo, são estas mesmas regras que, à primeira visita possam servir de precioso auxílio, dificultam a evolução do nosso trabalho como designer. É aqui que o logotipo para os Jogos Olímpicos assume a sua genialidade ao quebrar estas regras. E é esta mesma genialidade que o torna tão polémico. É um logotipo único e memorizável. O que a agência Wolf-Olins conseguiu fazer, foi criar uma linguagem visual que poderá ser aplicada a qualquer suporte sem tropeçar em repetições monótonas que, quer se goste ou não, é algo extremamente complicado de resolver. Talvez ainda não poderei dizer que é um logotipo que adoro, mas a maneira como é inteligentemente usado em conjunto com a sua própria linguagem, deixou-me realmente convencido.

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www.london2012.org
(website oficial)
www.gopetition.co.uk/online/12539.html
(website da petiação para mudação de logotipo)
www.wolffolins.com
(website da agência que criou o logotipo)
www.aldaver.com
(website com colecção de logotipos dos Jogos Olímpicos)

2007-09-25

a pureza da luta


Milhares de monges budistas pacificamente se manifestam pela democracia na Birmânia.
"No injustice can last for ever", says Gordon Brown

2007-09-24

Realpolitk para as urtigas



China's Neurotic Petulance over Tibet
German Chancellor Angela Merkel shakes hands with the Dalai Lama after private talks at the Chancellery.

2007-09-16

Realpolitik, por razões óbvias

Pela segunda vez o Dalai Lama veio a Portugal. E ainda não foi desta que foi recebido pelo Governo português, nem tão pouco a Presidência da República "inventou" um encontro como Jorge Sampaio havia feito em 2001. Para além de uma falta de respeito e indelicadeza pessoais, é um profundo desprezo político e humanitário. Como muito bem disse Ana Gomes, não se sabe que alguém tenha sido comido por Pequim, mas o que é certo - ou melhor, "por razões óbvias" - Portugal tem medo que isso lhe aconteça. A sua posição de fragilidade face à pressão da China apenas reforça a real insignificância que Portugal tem no panorama das relações internacionais. Pelo menos a este nível. O medo de afrontar para não prejudicar o "investidor" chinês é sintomático da hipocrisia e baixo nível intelectual desta diplomacia. O facto de sermos uma nação com uma relação longa e única com a China, ao fim e ao cabo, não trouxe vantagem alguma. Durante décadas se dizia que Macau era a porta de entrada de Portugal no Oriente, mas a China nunca foi muito nessa conversa não se interessando por fazer o percurso inverso quando tinha a todo-poderosa Hong Kong mesmo ali ao lado. Assim como se continua a clamar que as ex-colónias são portas de entrada em África. Falso. A pequenez lusa cai sob o poderio chinês - e de outros - que tem se estendido por quase todo o continente sem precisar deste ou daquele para lá entrar. A China entra para obter poder, "por razões óbvias".

Portugal diplomaticamente rege-se por estranhas e contraditórias atitudes, onde apenas Timor foi a causa justa. Aliás, de causas justas está o mundo cheio, mas são atitudes justas que escasseiam. De forma a romper isto está o governo de Gordon Brown a opôr-se a Mugabe. A cimeira UE-África, a realizar-se Dezembro em Lisboa poderá ficar marcada negativamente pela vinda do ditador do Zimbabwe e a ausência do PM britânico. Mas de ditadores continua África a ter demais, e eles virão cá também. Contudo, uma posição de força está o Reino Unido a tomar contra actualmente o pior déspota africano, que continua no poder defendido, por exemplo, por Angola - que muitos se esquecem, ou fazem por isso, de que se trata de um Estado autocrático. Com a mesma mão que recusou apertar a do Dalai Lama, apertará o Governo português a de Mugabe, José Eduardo dos Santos, entre outros. Os valores humanistas e humanitários continuam somente nas conversas coloquiais de conferências mediáticas. A hipocrisia e a falta de atitudes correctas continuam a dominar as agendas.

2007-08-30

O poder da influência



Temos sobre os nossos filhos diversas responsabilidades e deveres, sendo uma delas essencial, fazer deles seres humanos. Cabe a nós pais definir e conduzir a sua educação segundo regras e formas de conduta que consideramos as mais correctas - sendo estas tão ambíguas como variadas de família para família - mas existem ideais comuns a todos: a honestidade, a argúcia, o respeito, a tolerância. Possuímos sobre eles um poder imenso para moldá-los à nossa semelhança, ao que gostaríamos que fôssemos, ao que desejamos que sejam, às leis universais democráticos e humanistas, aos cânones da nossa sociedade e civilização. Tudo isto é a base para o futuro das crianças, seja agora, seja quando adultas.

Também na Palestina isso é claramente visível. Mas é por demais conhecido o ódio palestiniano ao ocupante israelita, conflito demasiado longo e demasiado complexo, mas igualmente demasiado importante para o Médio Oriente e o resto do mundo. E este ódio vive todos os dias, faz parte da existência de muita gente na dura realidade do que é um povo aprisionado na sua própria terra, subjugado diariamente à humilhação, à pobreza, à miséria, ao não-futuro, à morte. Mas a luta pela liberdade não pode socorrer-se de determinados meios. Enraizada entre todos, a política olho-por-olho, dente-por-dente, nunca foi, nem nunca será o caminho. Durante cinquenta anos gerações de palestinianos sobrevivem à custa de algo inacreditavelmente poderoso, e intrinsecamente humano: o ódio. Sucessivas gerações têm-se alimentado desse ódio como arma vital contra o inimigo, apenas para prolongar o sofrimento de todos e inviabilizar soluções justas e libertárias.

A meio do primeiro semestre deste ano, a TV do movimento Hamas (o governo da Autoridade Palestiniana até Julho, agora confinado a Gaza) iniciou um programa destinado às crianças, no mínimo suis generis. Nele surgia um rato em muito semelhante a Mickey Mouse (a estratégia da sedução), de seu nome Farfour. Este, em conjunto com a jovem apresentadora apelava à Jihad anti-sionista e a supremacia islâmica (a estratégia da mensagem) em linguagem tão conhecida como incrivelmente inocente na voz destes interlocutores. Do mesmo modo como quem ensina uma criança a contar. Crianças telefonavam tecendo palavras violentas que ouvimos de tantos adultos (a estratégia da fraternização). Entretanto, numa maior dramatização, a par dos intensos conflitos pró-guerra civil entre facções do Hamas e do Fatah, o querido Farfour foi capturado pelos serviços secretos israelitas, interrogado e sumariamente executado (a estratégia do inimigo). Tudo isto encenado. "Devemos dar graças ao nosso mártir Farfour, que sucumbiu sob o nosso inimigo sionista" informava a menina (a estratégia da vitimização).
Nascem e crescem milhares de crianças entre os escombros de uma sociedade votada ao ódio e à vingança. Como poderão eles fazer do seu futuro um horizonte de liberdade? Haverá hipótese de alcançar a paz num ambiente que, por sua culpa e do ocupante hebraico, apenas conhece a violência e a prisão? Crescerão como adolescentes que atiram pedras nas ruas contra os soldados, e tornar-se-ão militantes armados ou suicidas mártires. O ciclo repetir-se-á e a esperança de mudança nunca se poderá erguer. É o radicalismo em todas as suas variantes que determina o futuro destas crianças. A influência dos adultos sobre as novas gerações fá-los acreditar que apenas a luta armada é o caminho, o ódio uma arma poderosa, a morte a salvação. Não é isto que devemos ensinar às crianças, por mais justa que seja a luta do povo da Palestina.

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Aqsa TV
16 Abril: http://www.youtube.com/watch?v=jB4bKLnXPIQ
30 Abril: http://www.youtube.com/watch?v=2zSR2QnJ0Z4


CNN: Teaching kids to hate
http://www.youtube.com/watch?v=IbOHZp3Ru_4

Islamic militant group takes the Mickey
The Islamic militant group Hamas enlisted a familiar-looking rodent to spread its message of armed resistance. This giant mouse, now pulled from screens, had been preaching in a high-pitched squeak to kids on a popular TV show about fighting Israel.

2007-08-27

icon - Manifesto issue

Apple Keyboard



2007-08-03

Férias

2007-08-02

Africa as an investment

Diálogos




Diálogo sobre uma proposta de identidade, trabalhado sobre um conceito promissor e muito interessante, mas após a apresentação teve de ser adaptada aos gostos do cliente.
Como assimilar o que nos é pedido? Até onde a interferência? Como aceitar alterações opostas ao apresentado? Como é possível compreensões conceptuais tão diversas?


V:
Não consigo entender a falta de cultura visual de algumas pessoas. Em nada, mas nada está o que eu associo ao tema. Posso até admitir que as nossas primeiras propostas não fossem bem aquilo que o cliente afinal queria. Mas... desta forma?

F: Talvez tenhas razão, mas de uma série de ideias que fiz, o cliente rejeitou-as.
E no fundo caímos sempre no mesmo: Ou fazemos como o cliente quer e paga. Ou não fazemos o trabalho.
Infelizmente não me é possível ser selectivo em relação aos projectos.

V: Afinal, quem pode?

F: O mentor do projecto até só contou comigo para o design, por ter sido recomendado pela cliente.

V: Tenho pena, pois é um trabalho com imensa visibilidade. É bom dinheiro ao menos?

F: Infelizmente é um pouco sempre assim. Talvez é falta de tanga de vendedor para abrir os olhos aos clientes, o que leva a um gajo a "adaptar" a criação para poder vender o trabalho.

V: O dinheiro sabe bem, mas nestas circunstâncias parece que nos vendemos de forma suja. Trabalho é trabalho, e há que ser remunerado por isso. Mas o empenho poucas vezes é retribuido.

F: Trabalhar para o cliente ou para os clientes do cliente? Deviam ser duas situações uniformes. Infelizmente há muitos casos em que as diferenças são enormes.

V: Refiro-me ao empenho em trabalhar, sabendo que nos esforçamos para encontrar a solução certa.

F: O problema está na definição de "solução certa".

V: Ambíguo sempre mas, como falámos antes, bem apresentado/vendido sobrepõe-se à do cliente.

F: Solução certa para o criativo: a mais de acordo com o conceito e valores? A mais apelativa? A solução certa para o cliente/empresa é a solução económica?

V: Mas ambos são conciliáveis. O problema existe quando a mente não é suficientemente aberta ou compreensiva.

F: É a discussão entre o jogador de futebol e o dirigente desportivo. O jogador é o que está no campo e conhece as dificuldades, os adversários. O dirigente tem em mente a sustentabilidade do negócio-futebol.

V: E as tricas...

F: Podem estar no mesmo "campo", mas dificilmente falam a mesma linguagem.

V: No fundo é disso que se trata sempre: comunicação.

F: Sim, entre o criativo e o cliente. Acredito também que comunicação do projecto possa ser favorecida com uma estrutura gráfica apelativa. É isso que vou tentar fazer. Cada vez mais tento não dar importância em demasia aos logotipos. O grafismo, os textos e conceito, tudo deve estar bem coordenado ou de nada vale um bom logotipo. Aliás, os grafismos e as peças onde o logotipo está inserido devem comunicar por si só, tal como se o logotipo não existisse.
Por exemplo. Se vir só o logotipo da "Virgin" num fundo branco, acho-o super desactualizado. Agora, quando o vejo aplicado num site ou outra peça, já me agrada. Agrada-me a imagem que vejo, as cores, o tipo de letra, etc. Ou seja, admiro todo o conjunto e nunca um pormenor específico da peça, como o logotipo.
Ou seja, quando crio tento guardar parte dos cartuchos para os projectos pós-logotipo. Assim, o trabalho vai-se renovando, o cliente vai ficando mais espantado com os resultados obtidos ao longo do tempo. E, claro, motivo-me mais.

V: O logotipo por si, para além de difícil, nunca poderá definir toda a comunicação. Obviamente que a comunicação em si é dada pelas diversas peças delineadas. O conjunto definirá o conceito de forma mais ampla e original. Agora para vender um projecto, a apresentação do conceito deverá ser clara, apelativa, cativante. Mostrando todas as peças ou não de inicio caberá ao briefing, ou à relação com o cliente. A comunicação visual e oral são sempre elementos primordiais. Entregar uma proposta sem apresentação oral pode ser um ponto a desfavor do trabalho. Mas isso pode ser colmatado com um breve apresentação em flash.

F: Flash, talvez resultaria. Mas torna-se trabalhoso e dispendioso.
Mas acontece que há quem diga sempre: "Entendo perfeitamente o que queres dizer. Mas estava a pensar noutra coisa..."

V: Mas quando o cliente diz isso é porque:
1 - não sabe o que quer, afirmando-o
2 - não disse tudo o que queria dizer
3 - não se entendeu o que o cliente pediu

F: Concordo.

V: Imagina que é um concurso, ou é primeiro mostrado a uma pessoa dentro da empresa e não o "chefe", dificilmente reproduzirá o que lhe dissémos. Vantagens: apresentação clara, apelativa, cativante, sempre. Em qualquer altura.
Mas isto desta forma, claro que dependerá do tipo e forma de contacto com o cliente. Tal como na medicina, cada caso é um caso

F: Mas ao contrario da medicina, todos se julgam criativos, até o próprio cliente.

V: Verdade infelizmente.

2007-07-29

Porsche Museum



2007-07-28

2007-07-26

Lusofonia a (R)evolução



Está online uma short-version do excelente documentário Lusofonia a (R)evolução produzido pela Red Bull Music Academy em colaboração com a RTP (transmitido na RTP1 num sábado do mês passado), e com a usual óptima pós-produção e montagem da Subfilmes. Grande parte do conceito que defendo está aqui, numa linguagem única e de potencialidade imensa.

Para ler mais em:
http://www.myspace.com/lusofoniaarevolucao
http://www.danceplanet.com/modules/noticias/noticia.php?id=842


Sinopse
Está a afirmar-se em Lisboa uma geração de músicos, produtores e DJs que, atenta às mutações estéticas e tecnológicas na música, não deixa de pugnar por um traço distintivo herdado pela cultura de que fazem parte: a Lusófona. É esta que favorece a singularidade dos nossos artistas num contexto histórico em que a uniformização na criação ofusca a singularidade. Lusofonia, a (R)Evolução é um cartão de visita sobre a identidade musical Lusófona.

O movimento de músicos de Lisboa – de Sara Tavares, Lura, Chullage, Buraka Som Sistema ou Sam The Kid – emana características únicas: sejam ritmos, melodias, vocábulos que sintetizam através dos sons cinco séculos de história conjunta entre os territórios que hoje partilham o idioma Português.“Lusofonia, A (R)Evolução” está dividido em várias partes:

1. As Raízes da Fusão
A música funcionou como um meio de integração social desde o séc.XV - início da exploração marítima de Portugal. As trocas sociais e culturais fomentaram o aparecimento de géneros musicais tendo como base um entreposto de escravos, Cabo Verde. O saudoso Raul Indipwo revela uma visão atenta e credível sobre as ligações entre, por exemplo, Fado e Morna, numa óptica em tudo idêntica à de José Ramos Tinhorão, publicada no livro “Os Negros Em Portugal: Uma Presença Silenciosa” - que serviu de base bibliográfica a este segmento do documentário.

2. A canção é uma Arma
A música também desempenhou um papel preponderante nos países lusófonos, quando estes viviam sob regimes ditatoriais (em Portugal e Brasil) e coloniais (em África). O movimento brasileiro Tropicália nasceu neste contexto e artistas nacionais e dos PALOP usavam a música como um meio de consciencialização social.

3. O Boom dos Anos 80
Não apenas nasceu uma indústria discográfica no decénio 1980-1990, como também começaram a chegar músicos africanos a Lisboa iniciando-se um processo de intercâmbio – que daria poucos frutos nesta década.

4. A Nova Mestiçagem
Foi nos anos 90 que a ideia de lusofonia ganha uma nova vida graças a uma geração de música urbana, influenciada pelo hip hop. Filhos de imigrantes despontaram através da compilação “Rapública”; bandas como os Cool Hipnoise davam uma nova abordagem aos ritmos brasileiros; os Kussundolola promoviam um Reggae angolanizado e editoras como a Nylon pugnavam por um produto português feito por executantes lusófonos. Os anos 90 foram uma época de transformação mas uma fusão musical lusófona decorre no segundo milénio. “Talvez um dia quando falarem em Lusofonia não vão estar a falar só do Português, mas também de tudo o que isso derivou...”Chullage (Músico), in “Lusofonia, A (R)Evolução”

5. Sons em (R)Evolução
Depois de 2000 os fenómenos de cruzamento lusófono tornam-se por demais evidentes. Marcelo D2, no Brasil, cruza Samba com Hip Hop; Nigga Poison e Chullage dão ao crioulo uma nova roupagem; os Buraka Som Sistema pegam no Kuduro para criarem uma nova música de dança, lisboeta; Lura e Sara Tavares, ambas naturais de Lisboa, operam na world music, seja seguindo a tradição de Cabo Verde, no caso da primeira, seja amalgamando elementos, no caso da segunda.

2007-07-24

A 21st century catastrophe

MILK please