2007-04-19

Polémica com Marca



"A marca é o elemento catalizador que confere sustentabilidade a todo o processo, ajudando a criar percepções na mente do consumidor. Uma marca identifica, diferencia e garante, influencia atitudes e comportamentos, desperta emoções e cria relações fortes. Uma marca é uma fonte de criação de valor." Este é um excerto do texto de apresentação da marca ALLGARVE feita pela MyBrand, sob solicitação do Ministério da Economia e da Inovação (MEI), através do Turismo de Portugal. Está correctíssimo na sua argumentação. Uma marca é isto. Mas a marca ALLGARVE não tem, até agora, atingido estes objectivos. Não é bem uma Place Brand mas a sua divulgação lançou uma polémica de contornos negativos com uma projecção como se o fosse de facto. À má-língua diz-se que foi o próprio Ministro Manuel Pinho que sugeriu o nome. Seja como for, à parte as boas intenções, a explanação do conceito e a sua implementação, o que é certo é que o Algarve (com um só L) "chumbou" a marca como foi concebida. A reacção a ALLGARVE atingiu proporções inimaginadas pelos autores.

A região, para o qual esta campanha promocional foi anunciada - um projecto de valorização inserido num programa de oferta e animação cultural para a Região de Turismo do Algarve - sente-se ofendida entre a "gralha e a ofensa à identidade cultural". O deputado algarvio Mendes Bota num requerimento parlamentar imediatamente escrito repudia a designação e considera como mais uma "desconsideração do poder central para com a região". Afirma que os argumentos da marca "são insuficientes", e não necessitando do "abcesso inglês 'all', para designar todo o Algarve" e que esta alteração apenas "poderá servir para destruir um nome que, a par do Vinho do Porto, é dos poucos de que Portugal se pode orgulhar". Continua dizendo que "está em causa tão somente o nome Allgarve", exigindo que seja removido por ser "uma afronta ao bom e verdadeiro nome do Algarve, um golpe na coerência de uma marca consolidada internacionalmente há muitos anos" e tratar-se de "um estrangeirismo descaracterizador" da identidade cultural algarvias e "falta de bom gosto e de bom senso". Conclui pela suspensão da campanha "até se redefinir um título que reponha a dignidade e o respeito pelo nome da região".

Éramos o Reino de Portugal e dos Algarves, e com a implantação da República Portuguesa o Algarve ficou mais tarde para os ingleses, assim não vejo como mais uma letra poderá ser problema... Mas brincadeiras à parte, se os autarcas e demais sociedade algarvias discordam, seja pela incompreensão do conceito, seja pela sobreposição de um anglicismo ao original linguístico, faltará comprovar no terreno as vantagens da marca. O target não são os que estão indignados, são aqueles que virão gastar dinheiro. Aí veremos, quer se concorde quer não, se a ideia e o plano funcionam. Contudo, para já, a aplicação e as regras para a inserção da palavra ALLGARVE advogam no texto de apresentação da agência como nunca se sobrepondo à marca Algarve e surgindo sempre com o "endosso" da Região do Algarve tal como apresentado na imagem acima. Acontece que esta regra já foi desrespeitada, pelo menos numa página da revista Visão. Aqui, o logotipo da Região do Algarve está substituída pela identificação do MEI.

Ricardo Araújo Pereira (Gato Fedorento) na sua crónica semanal da Visão, lança com imensa originalidade diversas sugestões utilizando o mesmo critério das letras/estrangeirismos. Por que não mudar Portugal para Poortugal? Afinal, nas palavras do ministro proferidas na China, somos competitivos porque ganhamos pouco. Nesta ordem de ideias, tão estapafúrdia como o próprio Allgarve em questão, não parecerá tão descabido se por acaso surgisse a marca Miño. Com tantos que desejam ser espanhois e a ilusão por nuestros hermanos. Já me causa espécie que Porto e Vinho do Porto sejam há muitos, muitos anos, mesmo em Espanha, conhecidos como Oporto. Quem terá sido o responsável? Já agora porque não ficou Oportugal se apenas de uma letra se trata?

Abusam-se dos anglicismos e de outros estrangeirismos. Servem apenas para enganar o ego e o consumidor mais desprevenido. Entendo todo o conceito desenvolvido para esta marca específica. Comercialmente pode ser bom, estrategicamente positivo, mas na sua raiz afinal a identidade nacional não entra. É um mal nacional ainda com o preconceito do mau-de-cá/bom-de-fora. Tantas marcas portuguesas se apresentam com nomes assim, quer para a internacionalização, quer para melhor enfrentar o mercado neste rectângulo. Efeito também da globalização e de uma certa dificuldade em encontrar nomes mais sonantes em português, há nomes que talvez convenha ter mais atenção.