2007-04-23

Reino (des)Unido-I

Nacionalismos na Europa
A questão dos nacionalismos na Europa é uma questão tão interessante quanto preocupante. Séculos de conflitos onde territórios fizeram parte de uns e de outros, criaram nalguns locais sentimentos eternos de inferiorização, de submissão, noutros de assimilação e integração ímpares. Vejamos, no lado ocidental da Europa, os que, sendo territórios de afirmação diferenciadora cultural e linguisticamente, possuem relativa autonomia, mas cujas ambições nacionalistas podem pôr em causa o Estado onde actualmente se integram: Espanha (Galiza, País Basco e Catalunha), França (País Basco) e Bélgica (Flandres).

Agora no Reino Unido novos focos de sentimento e desejo independentista existem. O ímpeto nacionalista da Escócia e Gales tentam romper as amarras da União, particularmente com as eleições regionais do próximo dia 3 de Maio - dois dias depois de se completar exactamente 300 anos depois da constituição do Reino Unido, cuja designação oficial e completa é The United Kingdom of Great Britain and Northern Ireland, Estas eleições podem, em cenários diferentes, ter consequências políticas para o Governo de Tony Blair e até mesmo para a entidade Reino Unido enquanto Estado. Nos próximos textos analisarei os diversos contextos e aspectos de como correntes nacionalistas podem pôr em causa a unidade do país.



Saint George's Day
A curiosidade do Estado Britânico é que, enquanto uma união de nações, é somente na Escócia e em Gales que o sentimento nacionalista é mais forte. Durante séculos a hegemonia inglesa sobre os outros povos da ilha roçou a arrogância e a sobranceria, mas agora não existe de facto um verdadeiro sentimento nacional inglês - excepto quando toca os conjuntos nacionais desportivos. De tal forma que hoje mesmo, 23 de Abril, é o Dia de São Jorge, santo patrono de tantos países e cidades mas que, venerado em Inglaterra como símbolo nacional (a bandeira de Inglaterra com a cruz vermelha sobre fundo branco é a St George's Cross), seja pela figura histórica, seja pelo mito da luta vitoriosa contra o dragão, não é afinal um feriado nacional. E muito se tem discutido estes dias esta questão e para torná-lo um feriado, ainda para mais quando é também o aniversário da morte de William Shakespeare, o mais famoso dramaturgo inglês reforçando a objectividade e a celebração da identidade nacional inglesa. Tem-se colocado diversas questões sobre como afirmar a nacionalidade, tal como os escoceses (St Andrew) e os irlandeses (St Patrick) com dias festivos e feriados nacionais. Creio que a questão da identidade inglesa se perdeu enquanto razão de ser a partir do momento em que a Inglaterra liderou o novo Estado, onde todos se tornaram britânicos. Ao longo do tempo e com os novos valores de tolerância e coexistência das últimas décadas, como em Portugal em afastamento da chaga salazarista, construi-se uma certa aversão ao nacionalismo, uma vergonha de quase existir com medo de provocar sentimentos negativos historicamente e xenófobos actualmente, indo até ao receio de que tal afirmação possa, também ela, pôr em causa a união. O que não significa que não haja uma percentagem que se supõe superior a escoceses e irlandeses, o que advém dessas mesmas contingências históricas e políticas.
Acontece que mesmo politicamente não tem existido qualquer partido nacionalista inglês, como vemos na Escócia ou em Gales. O British National Party, extrema direita xenófoba, defende a identidade britânica e o UKIP (United Kingdom Independent Party) defende a saída da União Europeia. Mas, ressurgido do anterior English National Party, afirma-se o English Democrats Party, cujos objectivos não são os mesmos de uma normal formação partidária nacionalista. Defendem que a Inglaterra deva ter os mesmos direitos e instituições como a Escócia e Gales, ou seja, o reconhecimento enquanto nação, e um Executivo e Parlamento próprios eleitos pelo povo, sempre na refundação dos princípios democráticos e do Reino Unido. É a questão da Devolution Act que abriu o precedente e o interesse renovado em que os ingleses possam governar-se a si próprios em iguais circunstâncias aos seus parceiros da União, pois afinal é o governo do Reino Unido que tutela a Inglaterra, através de nove territórios administrativos.
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