Não consigo evitá-lo. Perco-me na busca da razão e do sentido. Entendo a pertinência do momento, mas fraquejo pela indecisão que me apoquenta a racionalidade. O tempo muda muito. Constroi desejos e futuriza alegrias que, no entanto, tendem a desfazer-se em inglórias existências, promessas fúteis e certezas diminutas. Depois o ciclo fecha-se para recomeçar outro, para se revalidar a esperança e a vontade, uns para solidificar a matéria, outros para projectar a mudança. Contudo a confiança é mutável, na implícita medida da realidade cruel que nos envolve. A projecção do amanhã bifurca-se entre uma insustentável percepção de um mundo que nos é alheio ao controlo e ao entendimento, e um caminho idealista de percurso inevitavelmente intransponível.
Não perdi todas as utopias, ainda reside em mim uma réstia de realidade. Pela primeira vez situo-me no purgatório campo dos indecisos. E é um lugar horrível.
Nestas eleições presidenciais qualquer visão apresentada afigura-se como uma consequência sem fundo, questionando de novo a valor da existência de um presidente, muito particularmente face ao desenlace há muito pressentido. Isto convida à inércia, a um movimento silencioso que afasta a participação. Na verdade, com os poderes actuais, um Presidente deveria ter um mandato único de sete anos, findo o qual a renovação obrigatória do detentor do cargo elevaria e mobilizaria a disputa e a participação política e civil. O próprio exercício do cargo nestas condições evitaria leituras ou atitudes da simples busca da reeleição, tornando mais livre e presente a sua acção.
O voto em branco, na situação presente, torna tão ineficaz como inútil porque há sempre algo a evitar e uma visão por defender. "No inferno os lugares mais quentes são reservados àqueles que escolheram a neutralidade em tempo de crise", escreveu Dante.
O exercício da abstenção activa - o voto em branco - como emergente arma democrática, encontrará noutra ocasião, palco maior e decisivo para a sua aplicação.
Das candidaturas em disputa tenho um claro contra (Cavaco) e, um estranho dilema por resolver (Alegre ou Nobre). Os dias seguintes me conduzirão a uma reflexão e, consequentemente fundamentado, à decisão final.
(Continua amanhã)
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