2005-10-10

Falta de ambição, sempre

A exibição da Seleccção Nacional de futebol, sábado frente ao Liechtenstein, foi demonstrativa da cíclica e estúpida atitude de favas contadas que o português ostenta. A ideia-chave para este jogo era "falta apenas um ponto". Até Scolari dizia que bastava um empate. Atenção: nunca se joga para o empate, quem assim o faz arrisca-se seriamente a perder o jogo. E foi isso que quase aconteceu. Novamente frente à amadora equipa nacional do Grão-Ducado encaixado entre a Áustria e a Suíça, a derrota e a humilhação estiveram eminentes. Numa quase repetição da atitude pré-Grécia, a nossa selecção ia deitando tudo a perder, apesar da qualificação para o Mundial do próximo ano ser inevitável. Contudo, o que se viu em campo, após os iniciais minutos de alegria e esperança deu lugar a desapontamento e incredulidade várias. Considero incrível que uma equipa tão boa, com alguns dos melhores jogadores do mundo e outros de elevado calibre, apontada várias vezes como equipa-sensação, ou equipa de elevado potencial - basta vermos as prestações nos últimos três campeonatos europeus - que tal exibição seja possível. Jogadores que ganham tanto dinheiro não podem dar-se ao "luxo" de jogar mal. Pode ser exigência demasiada, e que eles são pessoas que erram. Mas justamente por isso não é aceitável que um grupo com ambições (de todos, não só de Portugal) para produzir resultados de topo possa realizar tais impropérios. Isto assenta sempre no carácter pouco vincado da positividade e da energia psicológica mobilizadora do português, que encontramos não só no futebol, infelizmente. Sendo uma actividade desportiva de grupo, é o grupo que interessa, e o esforço pelo bem comum é o mais importante, quer nos 90 minutos em campo quer nos resultados apresentados na tabela.

E a atitude do treinador/seleccionador? Como se pode justificar a teimosa e continuada convocação de guarda-redes suplentes? Como se compreende a falta de soluções alternativas quando determinados jogadores/posições não rendem eficazmente? Como se pode aceitar a eterna lacuna de um Plano-B? Como, apesar do esforço evidente do próprio, Pauleta continua titular? Como perceber a falta de ambição, a vontade de ganhar o jogo colocando Nuno Gomes a 10 minutos do fim? Perguntas várias de mais um treinador de bancada, mas evidentes para todos aqueles que gostam de acompanhar a Selecção, e especialmente para aqueles onde reside a última forma pura e alegre de ver futebol esquecendo a tristezas várias dos clubes e campeonatos nacionais. Onde, diga-se, as prestações de Benfica e Sporting na Liga e nas competições da UEFA especialmente, são incrivelmente confrangedoras.

Felipão consegui no entanto construir uma equipa com melhor potencial desde 1966. Simples e coerente, pautou-se sempre por uma ideia específica de equipa e de objectivos. No entanto, o calor e a alegria brasileiras não contaminaram por inteiro a interioridade estática do português. Orientador pertinente e original de um grupo de jogadores, tem faltado, ou melhor tem sido contaminado por esse mesmo defeito nacional. O que não se vê no trabalho de José Mourinho. Para ele é sempre jogo de mata-mata (expressão usada por Scolari). Não há alternativa a ganhar. O Chelsea esta época na Premier League já bateu o recorde de oito jogos inciais só com vitórias, tem 24 pontos e está a 9 do segundo classificado. Mourinho pode ser arrogante, parvo, por si ou construíndo essa imagem, mas é um treinador científico, nos apectos técnico-tácticos do futebol, com um enorme cariz psicológico sobre os seus jogadores, tirando e exigindo deles o máximo em todos os aspectos, tornando todas as suas equipas em conjuntos ganhadores e ambiciosos, tal como ele. A relação amor-ódio que Mourinho nutre entre tantos é um caso sui generis. Mas no fim quem ganha é ele.

A Selecção Nacional tem a oportunidade de fazer mais uma boa exibição na Alemanha. Não acredito que se possa ganhar, nem tão pouco se deve ir para lá a pensar que se vai ganhar. Recordam-se da idiotice do pedido do PM Durão Barroso semanas antes da partida da selecção para o Mundial2002 Coreia-Japão? "Tragam-nos a Taça" disse ele quando os recebeu em São Bento. E pronto, ficaram todos convencidos, a comunicação alimentou a esperança, o povo ficou cego de tal possibilidade pré-garantida e foi o que se viu...
Nada de expectativas altas! Foi com calma e concentração que permitiram os terceiros lugares em Inglaterra'96 e Holanda2000 (quase finalistas, não fosse a mão de Abel Xavier).
Mas muita coisa necessita mudar na "equipa de todos nós" se se pretende cumprir determinadas metas. Tem sido demasiadas vezes fácil passar de bestiais a bestas... Uma coisa é certa, concentrados e com apoio adequado e consciente, sem pensamentos de altos vôos esta equipa é capaz de coisas muito boas.

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