2009-12-21

Pela lama

Um site provisório, depois catorze sites comemorativos (!?), mais material gráfico a ser impresso, tudo somado numa quantia absurda de €180.000 para a Comemoração do Centenário da República. E ainda mais dez mil euros para a criação da identidade desta.
Quando soube há poucas semanas deste ultrajante negócio, o que primeiro veio à ideia é como é fácil usar o dinheiro do Estado, que é desde a primeira instância, o nosso dinheiro. O problema do valor do trabalho coloca-se na medida em que, como não existem tabelas no design, cobra-se usualmente por uma tabela interna que no entanto pode variar consoante o nível económico do cliente, mas pelo que se vê, se o cliente for o Estado então cobra-se mais ainda. Se Cristiano Ronaldo custou aquela massa toda ao Real Madrid e já ficamos tontos, sabemos no entanto que existirá retorno para o clube, bem o contrário do que sucede quando todo este montante é somente para um evento efémero.

O bom nome do design está a ser atirado à lama por causa de comportamentos bem pouco éticos (de todos os intervenientes), e todo o tipo de suspeição se levanta em particular por causa destes ajustes directos (prática legal quando o orçamentado é inferior a 206 mil euros). Presenciamos também aqui a atitudes contra o mercado, contra a livre concorrência, contra o mérito.
A confiança nas instituições e nas pessoas com cargos públicos volta a ser abalada, até mesmo o CPD, e a permanente descrença colectiva sustenta-se em episódios assim. Pode perfeitamente o trabalho ficar com qualidade (o Atelier Cayatte já o demonstrou por diversas vezes) mas não é esta a forma correcta de se fazer negócios, e muito menos com dinheiros públicos roçando a falta de transparência e o desprezo pelo bom senso. Porque no fim quem sai prejudicado é Portugal por mais "bonito" que se apresente com este ou outro trabalho de design. Todos os outros designers neste país esforçam-se todos os dias, a grande maioria fora de Lisboa e longe das grandes empresas, e o que não queremos é ter a sensação de viver numa república das bananas.

Noticía n'O Diabo

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Há cerca de três anos, uma instituição pública de ensino superior lançou um concurso para a renovação da sua identidade, competição na qual participei através de uma agência com quem trabalhava. Quando os resultados sairam houve uma outra agência que os contestou, ficando a saber-se se os requisitos exigidos aos participantes foram aceites e quais os orçamentos de cada um. Verificou-se que o vencedor havia falhado num requisito, ao contrário dos restantes que os cumpriam na totalidade, e que o valor do vencedor era de €49.900 creio. Todos os outros variavam de uns modestos €10.000 a €3.000. A qualidade do trabalho apresentado pelo vencedor foi o argumento principal, o que não foi posto em causa mas, a suspeição de se ter criado um concurso público (pela segunda vez) somente para atribuir a (pre)determinado vencedor ficou sempre no ar.
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