2008-06-30

Justos Campeones



A força da técnica venceu contra a técnica da força, e felizmente desta vez num jogo fantástico chamado futebol onde 11 jogam contra 11, no fim não ganhou a Alemanha. Tivémos um campeonato da Europa bem colorido, muito emocionante, surpreendente com habituais e inesperadas desilusões. No fim, a vitória justa da Espanha jogando futebol com garra e técnica, jogando bonito, inteligente e aberto, com um fantástico espírito de equipa e de entrega, onde todos, todos os jogadores foram estrelas. Foi o melhor final depois da afronta grega de 2004, e mesmo da entediante final à "la italiana" de 2006. É isto que queremos ver. É futebol assim intenso, apaixonante, que quem ama futebol quer sentir de verdade. O Euro 2008 prova que é possível o retorno a este tipo de jogo, bonito e criativo, matando com várias estocadas o jogo feio, fechado e sem estima que por acaso inexplicável do destino, em particular, nos tirou a imensa alegria da vitória há quatro anos.



Mas prova também que para se ganhar, seja um campeonato, seja mesmo um jogo, há que haver uma entrega proporcional à fantástica oportunidade de uma vida que uma fase final oferece. Ou seja, uma entrega a 100%. Foi isso que permitiu a fabulosa fase de grupos da Holanda e da Espanha. Foi essa entrega que nos deliciou a Rússia frente à Holanda (magníficos Arshavin e Pavlyuchenko) e a Turquia frente à Croácia. Foi essa imensa dedicação que vimos na final espanhola face à Alemanha.



Foi o que sentimos nas vitórias de Portugal frente à Turquia e à República Checa. Foi o que não vimos na estúpida derrota com a Suíça e no exagero (mesmo à portuga) do "oito dias de descanso" que permitiu que houvesse perda de ritmo e desleixo face ao melhor jogo que a Alemanha fez neste campeonato. A superior inteligência alemã ditou uma derrota lusa que, com uma outra postura que vimos no Inglaterra-2 Portugal-3 no Euro'2000, poderia ter sido outra. Falta o meu querido Luis Figo à Selecção? Claro, mas ele não dura para sempre. Com o lote fantástico de jogadores, reconhecido por toda a Europa, onde foi que Portugal falhou? Na determinação, na entrega, no excesso de "dias de descanso". Quando se encara um jogo a feijões e se vai para o campo com uma equipa C, a vitória da Suíça não deixa de ser paradoxalmente natural e escandalosa. Perfeitamente evitável. É fácil atribuir culpas. Mas todos reconhecem as excelentes vitórias nos dois primeiros jogos. Porque não se foi para o terceiro de novo para ganhar? A Suécia levou o castigo justo da eliminação pois quem joga para o empate perde sempre. A imagem de Scolari no banco, desesperado com a mão na testa como que desmaiando revela bem a impotência da equipa e da falta de estratégia da selecção. A derrota nos quartos-de-final afirmou-se justa mesmo assim. Considero as derrotas sempre boas lições. Porque demonstra as fragilidades e os erros que devemos corrigir. Que todos sabemos quais são, mesmo sendo meros treinadores de bancada. Infelizmente neste Euro uma derrota não foi suficiente.

Nesta entrega a 100% que foi bem visível, vimos claramente como o factor psicológico é tão importante como o físico. Mente sã e corpo são são os vectores para a competitividade total. A Turquia acreditou sempre, na sua capacidade, na sua mais-valia, na vitória. Apenas tombou face ao azar, a erros grosseiros de Rustu (iguais aos de Ricardo) face a cirúrgicos ataques da alta tecnologia germânica. No jogo de quartos-de-final, quando todos já pensavam na vitória da Croácia, o costumeiro volte-face turco ditou a derrota croata. Foi no golo do empate no minuto 119 que a Croácia perdeu; não foi nos penáltis, foi logo ali. É terrivelmente visível nos rostos dos jogadores croatas o peso da derrota e da desacreditação no momento das penalidades. A Turquia passou, porque nunca baixou os braços.
A fantástica vitória russa à toda-favorita Holanda foi um hino. Mas as debilidades de uma equipa jovem vieram ao de cima com a lição muito bem estudada pela Espanha, na meia-final.

Honra e justiça seja feita às equipas que mais emocionaram neste Europeu: à Holanda, Turquia, Rússia e à Espanha, justa Campeã da Europa 2008.