2011-05-12

Utopia

Sussurras doces palavras enquanto o teu corpo-deusa me amarra em canduras que muito quero sentir. Seduzes-me com olhos cheios de sonhos e vejo mundos (im)possíveis onde contigo quero voar. Afago-me no calor quase maternal de uma promessa que teus braços firmes me fazem. Convences-me com o conforto de uma ideia, a segurança de uma possibilidade, uma busca de felicidade como destino inevitável.
Contemplo-te após aquele abraço de paixão. Diante de mim está a utopia e não quero fugir. Enredo-me no fascínio das tuas curvas enquanto te levantas e caminhas com volúpia para fora do teatro de sonhos que esta cama exaltou.
De livre vontade escolho mergulhar neste encantamento. Entrego-me ao desejo e ao sonho, afasto de mim o pecado e a lúxuria. Pois nesta cama de paixão onde a utopia comigo se deita, começa uma realidade exaltante à medida que a manhã ilumina o mundo do nosso quarto.

A utopia é como uma mulher apaixonante. O cheiro suave que emana da pele quente como um caminho certo para a meta. É um corpo que nos arrepia na certeza que a beleza é sagrada. A utopia é a sedosa textura dos cabelos, fortes e belos, que nos toca com a delícia de uma manhã de verão. É o amanhã radioso que nos fará cantar. São os lábios quentes que nos beijam pela noite, ou a voz inteligente que nos encanta para o sonho. É o sorriso puro que nos faz acreditar.

É esta crença que parece desaparecida. Os homens perderam o sonho, desacreditam utopias, esvaziam desejos, desocupam futuros. Tropeçámos nas ilusões confundindo-as com as efémeras flores de inverno. Traimos as nossas aspirações de igualdade, desvalorizámos os objectivos de liberdade, esquecemos o significado de fraternidade. Misturámos conceitos evolutivos de coisa nenhuma, mitificámos a idealização, matámos a nobreza da imaginação. A utopia perdeu-se quando os homens se deixaram corromper por falsos ídolos de ideologias extremas ou rumos egoístas. Demasiados permitiram-se vaguear por ideais de ilusão que nos atropelaram a realidade, mudando as percepções e a face de um mundo que se construiu em escombros tóxicos de um chão outrora fértil. Não podemos continuar a desacreditar sob pena de sucumbirmos na cruel mediocridade que nos pisa.

Todo o ser humano tenta acreditar em algo, é transcendente a si próprio. Para uns será um ideal de razão, para outros uma busca de luz. A utopia não é religião, ou uma crença cega, é uma ambição natural para um propósito comum, um entendimento inevitável para justificar um objectivo, um conceito pelo qual podemos trabalhar para cumprir..
É necessário (re)encontrar o caminho certo. Acreditar numa utopia tem o seu lado inocente e ingénuo, mas não se é tolo por acreditar na mudança e num projecto claro que nos faça (re)erguer.
A utopia não pode cingir-se a uma ilha imaginária, ou reduzir-se a uma sociedade fora de tempo. A utopia é o intangível que nos move, um baluarte de esperança, uma terra prometida. A utopia é aquele momento orgásmico das revoluções justas, é um golo avassalador de Leo Messi, é a chegada do homem à Lua. A utopia é todo um trabalho de imaginação e criatividade, luta e justiça, para a política e para a sociedade, que nos conduz a um clímax de verdade e objectivos concretos.

Falta-nos sentir isso de novo. Precisamos acreditar de novo.
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