A vida moderna é movimento. Uma permanente catadupa de eventos que se expõem a intensidades cada vez maiores.
A vida moderna tem memória curta. O que com facilidade nos chega, facilmente nos abandona, rapidamente esquecida para que novas coisas preencham o mesmo espaço.
A vida moderna é menos. "Less is more" ("Menos é mais") - o aforismo de Mies van der Rohe - transformou-se num dogma erróneo ao sujeitar-nos aos novos padrões do Século XXI: menos tempo, menos sono, menos dinheiro, menos confiança, menos pensar, menos crença.
A vida moderna tornou-se uma confusão.
E é por isso que certos comportamentos se tornaram aceitáveis para a maioria. O dia-a-dia é demasiado curto para nos aborrecermos, para tentar entender. Todas as semanas sabemos de algo novo que nos irrita, envergonha, nos deixa atónitos, mas no fim, como podemos lidar com factos que nos escapam o controlo, que estão longe de entendermos as verdadeiras razões que movem determinados actos e (não-)argumentos? Por fim ficamos entorpecidos e não queremos mais saber.
Mas ao lidarmos com estes assuntos, demasiadas questões se levantam. Os últimos meses têm sido pródigos em (demasiada) turbulência, desconfiança, danos. Apesar do poder do conhecimento rápido, a vigilância dos media, e formas cada vez mais difíceis de esconder a verdade, a nossa crença nos valores da democracia não deverão, por muito difícil que possa parecer, serem minados.
A virtude do Estado depende da virtude dos Homens, disse Cícero. Terá a virtude sucumbido? Terá a virtude perdido o seu valor? Que valores do carácter importam realmente? Quão bem conhecemos alguém? Podem - devem - acontecimentos modificar o modo como percepcionamos as pessoas? Devemos reajustar as nossas crenças pensando apenas para o bem comum? Terá a persuasão se tornado num jogo cada vez mais enganador para ganhar (confiança) a qualquer custo? Acreditar em alguem é reconhecer que as suas falhas são naturais não importa as consequências? Devemos aceitar um mau carácter de forma menor ou maior que um mau político?
No Brasil um político local quase venceu umas eleições com um slogan surpreendente: "Rouba mas faz". Impressionante (a abertura) e escandaloso (o padrão). Podemos aceitar isto? Onde moram os princípios de igualdade e justiça, ética e rectidão?
Portugal e o Reino Unido estão sob dúvidas semelhantes sobre os seus líderes. José Sócrates e Gordon Brown são contudo homens bem diferentes. Quando o primeiro frequentemente tornou mentiras numa percepção geral; o segundo tem sido recentemente apresentado como um puto de gang. Sócrates perdeu a sua credibilidade interna e, por causa da agenda política actual, é bem capaz de permanecer no poder mais do que devia. Brown tem estado sempre sob o fio da navalha - por inúmeras razões - podendo mesmo perder as próximas eleições para um Partido Conservador que (me) inspira alguns receios.
Ambos têm, aos olhos do público, muitas razões para não inspirarem confiança - apesar de tudo são políticos(?) -mas o nosso julgamento dos seus carácteres foi redefinido pelo que poderão ser: um é um mentiroso, o outro um bruto? Assim sendo, como fica todo seu trabalho?
De um Primeiro-Ministro esperamos que tenha a maioria das (boas) qualidades humanas. Qualquer homem - todo o político - é definido pelo seu carácter. Melhor o homem, melhor o político. É isto que queremos deles.
_